Debaixo do Capô: uma breve análise dos elementos que compõem uma aplicação de Inteligência Artificial

Lukas Ruthes Gonçalves

 

Introdução

A aplicação da Inteligência Artificial no Direito é um dos temas que vem tomando conta de discussões e debates recentes sobre como melhorar o sistema judiciário brasileiro. De ferramentas como o VICTOR, recém-introduzido no STF, a novos projetos como o Dr. Rui e até mesmo aplicativos civis como aqueles capazes de pintar obras inteiras de maneira independente, os “robôs” surgem como a mais recente inovação que promete revolucionar o mundo como um todo e mudar a maneira como se vive em sociedade.

Porém, uma das dificuldades de se fazer uma análise efetiva sobre esse tema é que ele por si só motiva a criação de toda uma mitologia ao seu redor. Desde a narrativa sobre o Golem na tradição judaica do século XVI até iterações modernas como o Watson da IBM participando do programa de TV americano Jeopardy, ou assistentes pessoais como a SIRI, presente nos dispositivos da Apple, os exemplos são inúmeros. Afinal a questão de se homem conseguiria criar vida a partir de objetos inanimados sempre rondou a imaginação humana.

Por isso, muitas vezes corre-se o risco de extrapolar as reais capacidades do que essa tecnologia é realmente capaz de fazer. Alguns meios procuram associar a Inteligência Artificial com o fim de determinada profissão ou o fator determinante para o progresso da economia, o que não é o caso. Ela é mais uma ferramenta a qual, se bem utilizada, pode trazer muitos benefícios para a humanidade como um todo.

Com isso em mente, busca-se nesse texto fazer uma breve explicação dos elementos que compõem essa tecnologia, com o fim de se evitar explicações folclóricas sobre sua arquitetura e que extrapolem suas reais capacidades. Com base nos exemplos citados acima, elenca-se três elementos principais que viabilizam o bom funcionamento de uma aplicação de Inteligência Artificial, quais sejam eles seu algoritmo, o hardware em que ele é executado e os dados e a informações utilizadas nele. Esses elementos serão explicados em maiores detalhes a seguir.

O Algoritmo

Sendo uma aplicação de Inteligência Artificial em sua essência um programa de computador, o primeiro elemento que necessita ser estudado, e que constitui a base de todo programa do tipo, é o algoritmo. Esse se trata de “qualquer procedimento computacional bem definido que toma algum valor ou conjunto de valores como entrada e produz algum valor ou conjunto de valores como saída” (CORMEN et al., 2002).

Considerando a finalidade de uma aplicação de Inteligência Artificial de emular o raciocínio humano em diferentes atividades, como analisar processos judiciais ou pintar um quadro, o tipo de algoritmo que constitui esse software busca aplicar esse conceito. É desse ponto que deriva uma das principais técnicas de programação de um programa do tipo, chamada de Machine Learning, que é exatamente o que parece: uma tentativa de se ensinar a um programa um truque que até animais primitivos são capazes de fazer, nesse caso aprender com a experiência (ECONOMIST, 2015). A partir dele se desenvolveu uma modalidade de programação mais complexa denominada Deep Learning. Esse se utiliza de redes neurais artificiais, simulações simplificadas de como neurônios biológicos se comportam, para extrair regras e padrões de determinados conjuntos de dados (ECONOMIST, 2015).

O Hardware

Tratando-se de uma aplicação de algoritmo por meio de um software, cuja programação base por meio de Machine ou Deep Learning possui alta complexidade, é necessário que as tecnologias que dão suporte ao funcionamento de uma aplicação de Inteligência Artificial sejam igualmente avançadas. Isso porque um algoritmo de IA, apesar de seu grande potencial, não é capaz de ser executado sem um maquinário adequado para tanto. É nesse ponto que a velocidade de computação das máquinas em que os aplicativos de IA são executados ganha relevância.

As aplicações de Inteligência Artificial dependem largamente da evolução dos computadores que são utilizados para rodar esse tipo de programa. E a perspectiva é de melhora para a capacidade de computadores. Empresas como a Microsoft vêm desenvolvendo os chamados Computadores Quânticos, os quais prometem melhorar consideravelmente a capacidade de análise que as máquinas atuais permitem. Para efeito de comparação “em 1997, o Deep Blue da IBM analisava 200 milhões de movimentos por segundo para superar o campeão de xadrez Garry Kasparov. Uma máquina quântica, por outro lado, seria capaz de analisar 1 trilhão de movimentos a cada segundo” (GARRETT, 2018), o que aumentaria substancialmente a capacidade de uma aplicação de Inteligência Artificial de analisar e processar o terceiro elemento base para o bom funcionamento de programas do tipo.

Os Dados e as Informações

Além dos avanços na tecnologia dos computadores, como ocorre em qualquer processo de conhecimento, faz-se necessário que a aplicação tenha as informações necessárias para produzir determinado resultado. Quanto maior for a quantidade de informações e melhor for a qualidade dos dados, melhor será o resultado obtido por uma aplicação de Inteligência Artificial.

Então o que compõe esse terceiro elemento são justamente os dados que alimentam os sistemas e os permitem produzir valores de saída condizentes com sua programação. Stuart Russell e Peter Norvig escrevem que durante o período de 60 anos de história da ciência da computação, de 1950 até aproximadamente 2010, portanto, a ênfase tinha sido no algoritmo como principal objeto de estudo. Eles afirmam, contudo, que para muitos problemas faria um sentido maior se preocupar mais com os dados coletados e ser menos criterioso sobre qual algoritmo aplicar. Isso se daria por conta da grande disponibilidade de bases de dados presentes na Internet (RUSSELL & NORVIG, 2016). Assim, com base na pesquisa desses autores, uma aplicação de IA programada para desenhar quadros, por exemplo, produziria pinturas melhores quanto maior fosse o número de obras a que ela tivesse acesso anteriormente.

Conclusão

Esse breve texto não se propõe a esgotar todo o conhecimento a respeito do tema Inteligência Artificial, mas sim trazer à tona aqueles que se consideram ser seus principais elementos. Espera-se com isso contribuir para o estudo da área, ao tratá-la sob uma ótica a menos idealizada possível. Aplicações de Inteligência Artificial podem ser ferramentas muito úteis não só para o Direito, mas para a sociedade como um todo. Porém, é necessário tomá-las pelo que elas realmente são: programas de computador rodando em um hardware específico e que dependem de dados de entrada para produzir um resultado de saída satisfatório.

 

Referências

CORMEN, Thomas H., LEISERSON, Charles E., RIVEST, Ronald L., STEIN, Clifford. Algoritmos Teoria e Prática. 2. Ed. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2002.

 

ECONOMIST, The. How Machine Learning Works. 2015. Disponível em https://www.economist.com/the-economist-explains/2015/05/13/how-machine-learning-works?fsrc=scn/fb/te/bl/ed/. Acesso em: 28/08/2018.

 

GARRETT, Filipe. Computador e processador quântico: sete coisas que você precisa saber. 2018. Disponível em <https://www.techtudo.com.br/noticias/2018/03/computador-e-processador-quantico-sete-coisas-que-voce-precisa-saber.ghtml>. Acesso em: 15/10/2018.

 

RUSSELL, Stuart; NORVING, Peter. Artificial Intelligence: A Modern Approach. 3. Ed. Harlow (UK): Pearson Education Limited, 2016.

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