Direito Autoral & Marco Civil da Internet

O livro é produto dos instigantes trabalhos desenvolvidos ao longo dos últimos três anos dentro das linhas de pesquisa do GEDAI, os quais foram concomitantes com a construção, elaboração e promulgação da Lei 12.965/14, conhecida no País como Marco Civil da Internet.

O foco maior destes estudos está em lançar uma perspectiva inovadora sobre os direitos e garantias individuais inerentes à Sociedade Informacional.

Neste sentido, analisaram-se grandes temas transversais que estão subjacentes ao Marco Civil da Internet no Brasil, tais como:

• O direito à (auto)regulação da internet

• O direito de utilização livre e os dispositivos de proteção

• A reprodução no ambiente digital

• Um novo conceito de autoria para internet

• O caso do Google Art Project

• Os aspectos jurídicos no software na internet

• O Sistema Peer-to-Peer e os limites dos usos privados

A obra é fruto de um intercâmbio acadêmico sólido realizado por pesquisadores do GEDAI em parceria com grupos de pesquisas, a saber:

• Escola de Direito da Universidade Católica Portuguesa do Porto/Portugal

• Núcleo de Estudos e Pesquisa em Direito, Artes e Políticas Culturais (NEDAC)

• Grupo de Pesquisa Propriedade Intelectual, Transferência de Tecnologia e Inovação (UFSC)

No Brasil, com a aplicação do Marco Civil da Internet pelo Poder Judiciário, sem dúvida, se almeja atender às novas demandas sociais, relativas:

(i) à utilização dos recursos tecnológicos,

(ii) à disponibilização dos bens intelectuais protegidos pelo Direito Autoral; e,

(iii) às novas formas de acesso à informação pela internet.

Contudo, é preciso ter-se claro que o Marco Civil da Internet visa principalmente assegurar a liberdade de expressão e de informação, tudo para garantir a construção de espaços democráticos na Sociedade Informacional. Assim é que o Marco Civil da Internet, ao prever sanções decorrentes do uso indevido de uma determinada pessoa, categoricamente ressalta que não se admite a interrupção dos serviços básicos de acesso, garantindo-se a liberdade de expressão na internet como um espaço aberto e democrático. Os fundamentos do uso da internet no Brasil previstos na lei do Marco Civil respeitam o direito de informação e da liberdade de expressão, de igual modo, percebendo-os enquanto direitos fundamentais apontados na Constituição Federal, promovem e garantem a integração do cidadão brasileiro a esta nova realidade tecnológica da Sociedade Informacional.

É esta perspectiva contemporânea, inovadora e inspirada nas garantias dos direitos fundamentais, que norteou estudos e a construção da presente obra coletiva. Os primados estabelecidos pelo Marco Civil da Internet não são exclusivistas, no sentido de que, para garantir o direito de informação de uns, tenha que se tolher o de outros. Antes, explicita uma nova concepção de garantias fundamentais, abrangendo direitos civis, sociais e políticos para o exercício da liberdade de expressão e à informação, que dependem do uso dos instrumentos tecnológicos, dos serviços de infraestrutura dos provedores da internet, os quais não podem ser simplesmente suspensos por qualquer autoridade administrativa ou judicial.

O livro oferece ao leitor uma abordagem transversal dos temas dos Direitos Autorais na sociedade contemporânea, analisando-os no contexto social, político e econômico da Sociedade Informacional, propiciando uma reflexão sobre a aplicação do Marco Civil da Internet para fomentar o desenvolvimento tecnológico que efetivamente promova a inovação e a inclusão tecnológica/social.

Tais desafios ensejaram vários projetos de pesquisas articulados entre diversas universidades brasileiras e estrangeiras, bem como ações de intercâmbio de grupos de pesquisa e de especialistas, cujo alcance não se restringiu a barreiras nacionais e regionais.

A presente obra, em cada um de seus artigos, é a expressão deste diálogo acadêmico.

A proteção das medidas tecnológicas e da informação para a gestão eletrônica de direitos como consequência dos Tratados da OMPI e da transposição da Diretiva 2001/29/CE, foi objeto de análise de Maria Victória Rocha, professora da Escola de Direito da Universidade Católica Portuguesa, de Porto/Portugal, que contribuiu na presente obra com a perspectiva do Direito da União Europeia, trazendo a discussão sobre até que ponto se permite, aos titulares de direitos autorais, aumentarem os seus direitos de exclusivo de exploração para áreas tradicionalmente livres, inclusive a proteção informatizada organizada pelo direito sui generis do produtor da base de dados, o que afeta o equilíbrio entre os titulares de direitos e os utilizadores, com graves danos para estes últimos.

O estudo sobre a regulamentação da internet, feito por Thiago Marinelli Veiga, dentro das linhas de pesquisa do GEDAI, teve como ponto de partida uma abordagem crítica sobre a utilização do paradigma positivista liberal pós-revolucionário, como marco fundamental para o desenvolvimento de um sistema regulatório da internet. Apontando propostas alternativas de regulação que se apresentam mais adequadas para as características da Sociedade Informacional e da própria internet.

Os novos valores éticos da Sociedade Informacional foram analisados por Tiago Mendonça dos Santos, também dentro de seus estudos realizados nas linhas de pesquisa do GEDAI, com a finalidade de proporcionar uma compreensão do Marco Civil da Internet à luz destes novos valores éticos, o qual constatou que a nova legislação veio para proteger tais valores, de modo que a sua integração ao Direito brasileiro poderá consolidar valores fundamentais para a democracia.

As questões relativas à autoria na Sociedade Informacional, no estudo de Liz Beatriz Sass realizado nas linhas de pesquisa do GEDAI, com acuidade (re)contextualizam o fenômeno tutelado pelo Direito Autoral a partir da compreensão da noção de autoria para a construção de um sistema jurídico compatível com o direito de acesso à cultura e ao conhecimento.

Numa abordagem ampla, Guilheme Coutinho da Silva também desenvolveu os seus estudos no GEDAI, apresentando de forma clara e precisa como os instrumentos jurídicos internacionais sobre o Direito Autoral foram modificados ao longo do tempo, especialmente diante da evolução dos suportes dos fonogramas, tudo a fim de compreender a relação entre as mudanças tecnológicas e a tutela sobre as obras fonográficas.

Por sua vez, Luca Schirru, especialista em Direito da Propriedade Intelectual pela PUC/Rio, e Marcelo de Athayde Furtado Krieger apresentam suas pesquisas relativamente à tutela jurídica do software, cuja importância é fulcral na arquitetura da internet. O primeiro, analisando a viabilidade legal da engenharia reversa de programas de computador; e, o segundo, analisando a contrafação por violação da propriedade intelectual dos programas de computador.

A participação de Alexandre Ricardo Pesserl, em seu trabalho sobre a reprodução de obras autorais no ambiente digital, o qual também foi realizado dentro das linhas de pesquisa do GEDAI, estabeleceu uma nítida distinção entre o objeto de proteção do exclusivo de Direito Autoral e a reprodução de seu suporte material, que é mero veículo para a obra protegida.

No tocante à teoria do contributo mínimo criativo e ao domínio público em Direito de Autor, Sarah Helena Linke apresenta seu trabalho, o qual foi realizado dentro das linhas de pesquisa do GEDAI, sobre o caso do Google Art Project, demonstrando em sua análise que a reprodução de obras já em domínio público não incide proteção autoral, reafirmando o necessário equilíbrio entre o Direito Autoral e o Direito de Acesso aos bens culturais.

Com relação aos conflitos que envolvem a propriedade intelectual na internet, Marcos Wachowicz e Lukas Ruthes Gonçalves analisam especificamente o caso do sistema PEER-TO-PEER, para compreender os limites do uso privado das obras protegidas na internet, empreendendo um estudo de direito comparado europeu e brasileiro, para o fim de verificar a aplicação da Regra dos Três Passos estabelecida pela Convenção de Berna.

Por fim, Patricia Eliane da Rosa Sadeto, dentro dos estudos realizados nas linhas de pesquisa do GEDAI, analisa o direito à autodetermina- ção informacional na sociedade contemporânea, procurando identificar a aplicabilidade de tais primados no ordenamento jurídico brasileiro.

É fato que, historicamente, em todas as sociedades humanas, grande parte das pessoas sempre tiveram acesso limitados aos recursos tecnológicos, bem como sofreram restrições ao uso da informação. Agora, no Brasil, com a nova legislação do Marco Civil da Internet, está posto o grande desafio de sua efetividade, para que se consiga, diante do uso em massa dos instrumentos e aplicativos tecnológicos, ampliar a criação de novos espaços democráticos virtuais de acesso à informação. Contudo, nos regimes democráticos, a preservação dos novos espa- ços democráticos na internet, para o exercício da cidadania, devem ser garantidos, inclusive, se necessário for, com a atuação do Poder Judiciário.

O leitor poderá perceber nesta obra, que, além da reunião das pesquisas realizadas dentro das linhas de pesquisa do Grupo de Estudos de Direito Autoral e Industrial (GEDAI) vinculado ao Programa de PósGraduação em Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), se somaram os trabalhos de juristas e pesquisadores de distintas nacionalidades, na construção de novos fundamentos para interpretação dos temas mais atuais relativos ao estudo do Direito Autoral e das novas Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), com foco na nova legislação brasileira, a Lei 12.965/14, conhecida como o Marco Civil da Internet no Brasil.

Nosso agradecimento a todos que contribuíram direta e indiretamente para a publicação desta obra coletiva, evitando menção nominal a fim de não incorrer em omissão indesculpável.

As pesquisas que agora são publicadas foram objeto de intensos debates em seminários, congressos e eventos anteriores realizados no Brasil e no exterior com apoio das agências de fomento à pesquisa CAPES e CNPq.

Com a publicação desta obra, espera-se instigar o debate para o fortalecimento e a evolução do pensamento jurídico.

Marcos Wachowicz

Professor Doutor em Direito da Propriedade Intelectual na UFPR e Coordenador do GEDAI/UFPR